"Tá frio lá fora?", me perguntou a produtora do programa O Mundo segundo os brasileiros quando nos encontramos de manhã no hotel deles pra começar o dia de gravação da minha participação do programa de Amsterdam
Perdeu? Tem erro não, assista aqui.

Pode-se dizer que, yeah, tava bem frio — programa foi gravado no invernão. Na real, Amsterdam resolveu que ia aparecer na TV sem maquiagem e saiu mostrando temperaturas próximas de zero, chuva e, claro, por que não, só pra fechar o pacote, vento (você acha que é o país dos moinhos por quê?).
Insistimos, e aos poucos, Amsterdam foi pegando confiança e passou a sorrir um sol de inverno bem bacana. Aproveitamos bem, levei o pessoal pra alguns dos meus lugares favoritos... E eu pensei, olhaí, isso dava um belo roteiro de um dia em Amsterdam.
Mas na TV, sabe como é, não dá pra anotar e tal, então resolvi organizar tudinho pra vocês seguirem, incluindo um mapa no fim do artigo.
Vamos agora para versão estendida com comentários extras.
1. Het Spui - praça com história e cultura no centro de Amsterdam
Como chegar: lá passam os trams 1, 2 e 5 de um lado da praça, e os trams 4, 9, 16 e 14 do outro lado. Além disso, é apenas uns 500 metros do Dam, dá pra vir andando de boa
Horário de funcionamento: 24 horas, é uma praça na cidade
Endereço da batata frita: Voetboogstraat, 33, horários de funcionamento aqui
Começamos o peripatético dia na het Spui e antes de prosseguir deixa eu pedir pra você resistir à tentação de dizer "ispuí". A coisa toda soa mais como "spao", e o primeiro ésse é mudo mesmo e sim, holandês assusta à primeira vista depois a gente vai se acostumando e acaba até gostando.

Enfim, a Spui é uma praça bem bacana no centro de Amsterdam, e já falei dela em diversos artigos do Ducs, dando a dica da feira de livro de sexta-feira (paraíso dos ratos de sebo como certos daniducs que a gente conhece), de arte no domingo, e da melhor batata frita no coninho com sblorb de maionese (ou outros deliciosos sabores de infarto prematuro) ali do lado...
Repara também na pequena estátua que a maioria nem nota, de um moleque de mãos na cintura e sorriso sarcástico? Na frente dessa estátua os provos, um grupo amsterdanês de artistas-provocadores-troladores-da-sociedade, se reuniam para iniciar seus atos nos anos 60.
Os caras foram muito influentes, iniciando coisas avançadas como campanha contra o tabagismo (anos 60, cara!) e promover a cultura da bicicleta (que não, nem sempre foi dominante na Holanda, dá uma lida aqui).
OK, mas estava chovendo baldes durante a gravação, e ficava difícil convencer as pessoas que eu estava lá naturalmente, só pra olhar a praça...
("Eu adoro *glub glub* andar aqui pela *escorre* het Spui...")
...então resolvemos nos refugiar numa das minhas livraria favoritas...

2. Livraria ABC: clássicos, ficção, arte, quadrinhos...
Como chegar: dá uma lida no ítem anterior, a livraria fica na het Spui
Horário de funcionamento: Das 10h00 as 20h00 todo dia
Daí entramos na American Book Center da het Spui, uma das minhas livrarias favoritas na cidade. Tem os tipos de leituras que gosto: ficção, clássicos, arte (incluindo alternativa, tatuagem contemporânea), quadrinhos, cinema, livros de culinária, ficção científica, história e muita literatura de viagem.
Oooooou seja, o povo tem que me arrancar de lá, né. O limite é meu saldo, porque o bom senso dá uma travada assim que cruzo a porta. A Carla me aconselha a deixar o cartão em casa quando vou lá, porém às vezes eu esqueço de esquecer. Ops.
E se você é daqueles que clica no "estou com sorte" do Google e responde "Sim" quando o Clint Eastwood pergunta "are you feeling lucky, punk?", a ABC tem um lance bacana: você pode comprar um livro-surpresa, às escuras.
Eles embrulham o livro, põem umas palavras-chaves pra te dar um norte e você pode arriscar - e descobrir coisa boa que você passaria batido de outra maneira.
O livro que eu indiquei no programa é The Undutchables. Eu falei dele aqui nesse outro artigo, dá uma lida.
Bom, fora isso, a ABC também tem eventos culturais bacanas, promove cursos e palestras (fiz meu curso de fotografia através de lá), recebe autores, tem a possibilidade de você mesmo imprimir seu livro numa "máquina de livros".
Enfim, a palavra que você está procurando pra ABC é "cool", "cool pra caramba". Bem, talvez não "caramba" exatamente, use sua imaginação. Muito, muito cool.
E exatamente ao lado da livraria, a Spui ainda tem outro segredo bacana, o...
3. Jardim das Beguinas (Begijnhof)
É uma porta com cara normal, você fica meio tímido e pensa eu que não vou sair entrando na casa dos outros, magina. Tenha coragem, determine-se e entre e descubra o Jardim das Beguinas.
Beguinas eram mulheres que por qualquer motivo queriam viver uma vida religiosa e retirada, mas não queriam ser ordenadas formalmente como freiras. Elas criavam suas próprias comunidades, meio escondidas, e essa de Amsterdam existe desde a Idade Média.
A última das Beguinas de Amsterdam morreu em 1971, e até hoje moram só mulheres nas casas.
Além de ser bonito e tranquilo, o jardim tem uma das duas únicas casas de madeira ainda existentes em Amsterdam e uma capela com alguns painéis do púlpito sendo projetados por Piet Mondriaan (com dois aa mesmo, que era o nome holandês dele, MondriAAn, todo mundo briga comigo por causa disso menos os holandeses).
Mostre silêncio e respeito no Begijnhof, porque como eu disse, ainda tem gente morando lá, tipo, é a casa das pessoas.
A essa altura da gravação a chuva apertava, o vento ululava e era hora de se esquentar. Resolvi mostrar pra equipe que Amsterdam é bonita em qualquer tempo, com ou sem chuva e levei eles pra um café com uma vista sensacional da cidade...
4. Café Blue: linda vista de Amsterdam
Endereço: Singel 457 (3° andar do Kalvertoren Winkelcentrum), mesmas dicas de como chegar da Spui
Horários de funcionamento: veja aqui

Pertim, pertim da Spui, ali na ruela das batatas fritas (Voetboogstraat) você dá de cara com um portão que é a entrda de um Shopping Center. Quer dizer, os holandeses chamam de shoppingcenter (tudo junto porque aparentemente holandês não curte muito uma barra de espaço), eu chamaria mais de uma galeria.
De toda a forma: em cima desse portão tem uma estátua que data da época em que o portão era a entrada da antiga prisão medieval da cidade.

Entra tranquilão e acha o elevador panorâmico, e sobe no terceiro andar. Você vai achar o café Blue.
Ache uma mesa e peça qualquer coisa pra justificar você ficar lá se esquentando e vendo a linda Amsterdam escorrer pelas janelas (as minhas desculpas no programa foram um café e um brownie). Um dos momentos mais legais do dia (tanto que é uma das minhas 6 dicas de o que fazer em Amsterdam em dia de chuva).
4b: A "outra casa da Anne Frank", que não rolou no dia
Deu preguiça, mas levantamos pra andar mais um pouco. O plano era ir até a praça onde ficava a outra casa de Anne Frank: todo mundo conhece a casa da Anne Frank do centro, onde ela se escondeu, só que ela não morava lá: era na verdade a empresa do pai dela. Ela morava num bairro que gosto muito, e foi de lá que ela saiu para ir se esconder na casa famosa.
Mas o tempo não colaborava para gravar de novo em espaço aberto. Além disso a casa mesmo não está aberta à visitação (hoje é uma fundação para abrigar escritores refugiados de seus países de origem). Há apenas uma estátua na praça em frente, era mais só pra passar e apresentar o bairro, que tem muita história interessante.

Se quiser ir mesmo assim, o nome da praça é Merwedeplein e você pode ir lá com o tram 4 a partir da Spui. Desça na Victorieplein e ande um pouco. A casa dela era o número 37, segundo andar. Na esquina tem o café Blek, que eu gosto.
Na verdade, essa parte é tão legal que eu criei todo um roteiro só pra explorar a verdadeira casa da Anne frank e o bairro onde ela morava.
Como já tava na hora da gente almoçar, então pulamos a Merwedeplein e fomos descobrir uma das atrações recentes da cidade:
5. De Hallen - espaço urbano na antiga garagem de trams
Como chegar: tram 17 ou 7, desça na parada Ten Katestraat, ou tram 3 ou 12, desça na Overtoom. Se você tiver indo da Spui, ande até o Dam e pegue o 17 lá, se você estiver vindo da Merwedeplein, pega o 12.
Endereço: Hannie Dankbaar Passage 33
Horário de funcionamento: a passagem abre as 7 da manhã todos os dias e vai longe, só que cada atração tem um horário. Vá durante o dia que não tem erro
O De Hallen é o seguinte: era uma antiga garagem de trams da cidade (tram é bonde), ficou fechada por um tempo, o povo pensando, o que fazer com esse espaço?
(Isso é uma coisa muito legal da Holanda: é um pais pequeno, não se desperdiça espaço nem se derruba prédios perfeitamente bons so porque o uso original deles não serve mais).
O que fizeram foi transformar num espaço de convívio urbano mega legal: tem cinema alternativo, tem unidade de Biblioteca de Amsterdam (OBA) com café, tem uma miríade de lugares pra comer (as opções são mais restritas se você é vegetariano, o povo gosta de carne), tem estúdio de TV, tem uma loja/oficina de bicicletas que vende acessórios (foi onde eu apertei a buzina no programa, FUÉ *susto*).
Aliás, essa loja tem um programa social bem bacana de integrar pessoas com problemas psiquiátricos de volta na sociedade, além de trabalhar com reciclagem e restauração de bikes clássicas. Enfim, é bem mais legal do que uma simples loja de bikes.
E logo na frente dela tem o espaço para comer, um "indoor food market", com montes de barraquinhas de empreendedores locais vendendo comidas. Foi numa delas que comi o sanduba de carne de porco que fez sucesso, o povo ficou com vontade.

Nessa parte ficou um pouco confuso no programa, então vamos esclarecer a dica do cartão local: alguns lugares só aceitam dinheiro (note: aceitam dinheiro) ou cartão local, e não adianta vir com Maestro, cartão de crédito nem bla bla bla. O Albert Heijn, rede de supermercados onipresente na Holanda, é um deles.
Foi para essa pegadinha que eu quis alertar, que não é qualquer lugar que você puxa seu cartão internacional e pá, passa de boa.
Uns poucos lugares não aceitam dinheiro, como algumas unidades da Coffee Company e essa barraquinha no De Hallen, apenas cartão. Mas isso está muito longe de ser uma prática generalizada, cash é amplamente aceito em Amsterdam sim.
Bom, o De Hallen tem muito o que explorar, dificilmente dá pra ver tudo em uma visita só, é um espaço pra ficar voltando e descobrindo (inclusive porque ele evolui, não está finalizado), mas olha a hora, rapaz, já devíamos estar voltando...
Hora de ir ver o outro lado de Amsterdam.
6. Do outro lado de Amsterdam: Eye Filmmuseum
Como chegar: atrás da Centraal Station de Amsterdam, pegue a balsa para o EYE (tem uma plaquinha, ou pergunte mesmo). Se estiver vindo do De Hallen, pegue o tram 17, cujo ponto final é na Centraal. é impossível ignorar o prédio do Eye.
Horário de funcionamento: de domingo a terça, das 10h00 às 22h, de sexta e sábado, das 10h00 as 23h00, mas claro que ficam abertos até a última sessão acabar.

Amsterdam-Noord fica do outro lado do IJ, a baía na frente de Amsterdam, e é hoje um bairro cada vez mais cool. Só pegar a balsa de graça da GVB que sai atrás da Centraal Station e em minutos você pode descobrir cafés bacanas, restaurantes interessantes e o novo prédio do EYE Filmmuseum.
O Eye costumava ficar no Vondelpark, mas entrou na onda da revitalização de Amsterdam-Noord e hoje é lugar favorito. O que tem pra ver lá?
Primeiro, filmes, claro. Eles constantemente exibem o acervo, e é muito legal poder ver filmes clássicos que você só conhecia na telinha agora grandão, num cinema mesmo.
Daí tem a nova exposição permanente sobre a tecnologia do cinema, indo desde as primeiras câmeras (ou nem mesmo isso, com os flip books, o livro que você vai virando as páginas e põe as imagens em movimento) até o celular.
Foi nela que fiz as brincadeiras que aparecem no vídeo. É bem bacana.
Você pode também tomar uma cerveja ou vinho ou até jantar no bar/restaurante, vendo a waterline de Amsterdam, com os barcos passando, o sol se pondo. É uma experiência que recomendo ao menos uma vez na vida, papo sério.

E olhando o sol se pôr, porque a essa altura do dia já tinha aberto o sol, minha participação no programa foi chegando ao fim. Hora de me despedir da Luanda e do Alexandre (obrigado, caras) e rumar pra casa, pra curtir o friozinho na barriga de esperar pelo programa pronto.
Pegamos a balsa de volta e eu rumei pra casa nessa linda cidade que tenho a alegria de chamar de lar.
7. Bônus: Cervejaria holandesa: Arendsnest
Mas pera! Naquela altura já havia material suficiente pro programa, mas eu tinha planejado mais uma parada depois do Eye. Acabamos não gravando, mas veja, se você jantou no Eye e ainda tem pique pra continuar passeando, eu tenho uma sugestão.
Dá um pulo no Arendsnest e descubra porque a cerveja holandesa vai muito, muito além da manjada Heineken. Dei a dica completa dele no meu artigo sobre cerveja em Amsterdam, os melhores pubs.
Vai lá, quem sabe a gente não se encontra?
Mapa do Roteiro
Eu fiz um mapa anotado no Google pra te orientar no seu dia de exploração em Amsterdam.
Fontes e referências
- https://www.eyefilm.nl/bezoek/plan-je-bezoek
- http://www.mokums.nl/hetlieverdje.html
- http://dehallen-amsterdam.nl/contact/
- http://en.wikipedia.org/wiki/Begijnhof,_Amsterdam
- http://nl.wikipedia.org/wiki/Begijnhof_(Amsterdam)
- http://nl.wikipedia.org/wiki/Merwedeplein