
Eu lembro que logo que chegamos na Holanda, com a Carla trabalhando numa empresa holandesa, ela me contou sobre como um colega havia pedido para ela fazer um plantão no sábado. Ela começou a se justificar...
- Não precisa se justificar. Se não pode, não pode.
E foi pedir para outro colega.
Ficamos muito impressionados com isso. Como assim, não precisa justificar? Com o tempo, notamos que era bem comum holandês dizer não sem mais aquela.
Ao mesmo tempo, com o contraste holandês, fui criando a consciência de que a dificuldade em dizer (e ouvir) não é uma coisa assim, da nossa cultura brasileira. Sim, tem exceções, mas culturalmente o não é meio que falta de educação no Brasil.
E aí, né, acaba que a gente diz sim quando quer dizer sim ou talvez, diz talvez querendo dizer não e só diz não depois de uma longa e serpentuosa justificativa.
Não seco é meio que tapa na cara no Brasil.
Enquanto isso, na Holanda...
Com a entrada da Babyduc na pré-escola, eu fui vendo ela se adaptando - no começo as crianças chegavam nela e pegavam os brinquedos, ou empurravam, e ela chorava. As professoras chegavam nela e diziam: "você disse pro amiguinho que não queria? Tem que dizer não."
Hoje ela diz não e a professora só interfere quando o coleguinha não respeita. E a intervenção é no sentido de "coleguinha, você ouviu a Babyduc? Ela disse NÃO. Você tem que respeitar o que ela está dizendo".
Entende? Não é "coleguinha, pare de fazer isso porque eu estou dizendo", mas "pare de fazer isso porque a sua colega disse não e você tem que respeitar".
E eu lembro que na minha época a gente era ensinado a chamar a tia (na época era tia, hoje mudou, né? Minha sobrinha diz "prôfe"),e aí a tia brigava com o coleguinha. Aqui eu vejo elas sendo ensinadas a elas mesmas se defenderem e dizerem claramente o que não querem, diretamente.
(E ao mesmo tempo, aos coleguinhas, a acatar o não).
Assim eu vou vendo a petizada aqui na Holanda aprendendo a se impor e a dizer não e entendi como que os holandeses adultos aprendem a dizer na lata quando não querem algo, sem se justificar.
E eu com eles.