Dois dias antes de embarcar pra Berlin eu consegui cair da calçada e torcer o pé, o que foi incrivelmente estúpido e irônico, considerando que andei de patins e sobre lagos gelados sem grandes problemas, mas uma calçada me derrotou, acabando alguns centímetros antes do que eu esperava, resultando num pisão em falso e um trambolhão. Me entupi de anti-inflamatório, gastei um tubo de pomadinha de arnica holandesa e lá fui eu manquitolando para capital alemã.
Devido à minha condição, aventou-se a hipótese de tomar um ônibus de turismo, daqueles sight-seeing, hop on hop off, por vinte euros ao dia. Mas se tem uma coisa que eu e Carla gostamos, é explorar a cidade usando o transporte público regular dela. Conhecer uma cidade não é só ver os seus monumentos e locais históricos, é também ver e entender um pouco de como ela funciona de verdade, no dia-a-dia.
Obviamente que para entender uma cidade de verdade é preciso passar muito tempo nela, morar, talvez, mas ao sentarmos (ou nos espremermos, conforme o caso) com os locais nos trams, metrôs, ônibus, ao andarmos pelas ruas que eles andam, ver como eles são, andam, onde compram, como dirigem, atravessam a rua, entender a organização da cidade, norte, sul, leste, oeste e como essa geografia influencia na locomoção e na vida, temos uma janelinha pra alma da cidade.
O que é diferente de sentar em um limbo multinacionais de pessoas tão estranhas àquele lugar quanto você e sair, sem ter idéia de como, em frente a monumentos que você não sabe conectar ou integrar na cidade. Além de economizar uma grana, claro 🙂 Então, sem bumba de turista. Pus o pé machucado bem apertado na bota, taquei o Lonely Planet na mochila, a mochila nas costas, e fui, eu mais Carla, aprender a andar em Berlin.
Transporte público

Berlin é servida por ônibus, tram (no Brasil chamamos de bonde), trem (S-Bahn em alemão) e metrô (U-bahn em alemão). Primeira lição, você deve comprar o bilhete de transporte antes de embarcar.
Nas estações de metrô tem máquinas automáticas que vendem bilhetes e aceitam dinheiro, cartão de débito e crédito. Existem 3 zonas em Berlin, A, B e C. Pra turistar, você irá precisar basicamente das zonas A+B. O bilhete dá direito a andar em todo o sistema de transporte, incluindo trens, contanto, claro, que você fique dentro das zonas que pagou. Existem diversas opções de bilhetes - viagem única, 4 viagens. Nós optamos por comprar um bilhete válido pelo dia todo - em janeiro de 2009 ele custava €6,10.
As máquinas de venda tem menu em 4 línguas, obviamente inglês sendo uma delas, mas foi surpreendente como conseguimos nos virar razoavelmente bem nos menus em alemão devido aos nossos parcos conhecimentos de holandês.
Comprado o bilhete, é preciso validá-lo nas máquinas amarelas antes de embarcar. Se você resolver dar de esperto ou, cof, "esquecido", "turista perdido", está sujeito à multa. Os fiscais de Berlin não andam uniformizados, aliás. Pode ser qualquer um no transporte. De repente, aquele senhor tranqüilo levanta, tira uma carteira de identificação e sai a pedir os bilhetes. Os espertinhos acostumados a lembrar que deixaram a torneira da pia aberta em casa e dar meia volta quando avistam um fiscal uniformizado de longe irão dançar com €40,00 pra ter e memória melhorada da próxima vez.
Quando um fiscal começou a pedir bilhetes no nosso vagão, nem me cruzou a mente que fosse um fiscal. Achei que era alguém pedindo um troco, e sacudi negativamente a cabeça. Daí todos começaram a pegar os bilhetes e ele mando pra mim "tickets, please" (que é mais inglês do que o fiscal do metrô de Paris se dignou a falar comigo). Ops, sorry. Tickets. Tudo certo, sem multa para os Ducs. 🙂

As máquinas de venda de bilhetes também permitem que se consulte o mapa da rede de transportes de Berlin, o que pode ser uma mão na roda - as estações não são tão bem sinalizadas como as de Londres, por exemplo, ou Paris. Nós penamos procurando o mapa da rede de transporte nas estações de metrô, mas não achamos fácil. Até nos ligarmos que nas máquinas tinha. Quem salvou a pele enquanto isso foi o mapa (resumido) do Lonely Planet. De uma próxima vez, eu irei imprimir a rede do site de transporte públic de Berlin (linhas de tram aqui).
Uma versão mais barata e mais "local" ao ônibus de turismo é pegar a linha 100 de ônibus no ponto inicial, na frente do Reichstag, e ir sentar no andar de cima - os ônibus têm dois andares. Ela passa por diversos pontos turísticos de Berlin até seu ponto final, na Zoologischer Garten metro. É uma alternativa popular (e barata) entre turistas e locais.
O site da rede de transportes públicos de Berlin é excelente e tem muitos recursos - todas as linhas, preços, rotas, mapas, regras de funcionamento e mais. Vale a pena explorar (eles tem inclusive um jorney planner para celulares e outros aparelhos moveis, o que pode ser bem útil se você tiver um smart phone europeu ). E, oh, tem uma versão em inglês bastante completa.

Impressões
A maioria das cidades européias tem muito o apecto de antigo misturado com moderno, mas em Berlin isso é agudo, com arquiteturas díspares, de todas as épocas e períodos convivendo. Berlin é uma cidade com grandes cicatrizes (urbanas, mas não só), marcas fundas de seu passado, o que me parece uma evolução boa - até outro dia, ela tinha grandes feridas abertas.
Vocês, jovens que lêem o Ducs, talvez não lembrem, mas o muro e duas Alemanhas eram reais durante um bom naco da minha vida, embora eu só viesse a ter uma pálida idéia do impacto que este e outros eventos dramáticos da história do mundo que lá aconteceram ao me deparar com os rastros deixados por eles. Uma cidade que foi dominada por uma ditadura sanguinária (vocês sabem do que eu estou falando, o N. Me recuso a usar a palavra, ou o nome do ditador assassino que a liderou, para não atrair buscas indesejáveis via Google), bombardeada, invadida, dividida em dois do dia para a noite, com uma das metades vivendo por mais trinta anos sob outra ditadura totalitarista.
Claro que Berlin é muito mais do que história, ditaduras, passado misturado ao presente. Há uma juventude que agita uma vida cultural rica, alternativa, de vanguarda, mente aberta. Mas para mim, ao menos, para ver Berlin é preciso saber, ou querer saber, de seu passado. Entender como ele desenhou essa cidade que mistura arquitetura monumental soviética com prédios ultra modernos, construído nos espaços abertos por bombas ou deixados vazios quando o muro caiu.
Ver como os berlinenses escolheram reconstruir, recomeçar, fechar as feridas sem apagar as cicatrizes, que estão lá também para lembrar, pois lembrar é o primeiro passo para se reconciliar com o passado e assim se mover para o futuro, foi meu objetivo, pelo menos nessa primeira visita (primeira de muitas, sou um cara otimista). Se você tiver esse mesmo interesse em sua visita à Berlin, compre um guia que fale da história dela antes de ir. Ou mesmo, futrique na Wikipedia, ou dê um jeito de pelo menos ter uma noção do que lá aconteceu, porque o que lá aconteceu foi importante, dramático e tem reflexos muito vivos até hoje, no mundo todo, inclusive.
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