A primeira vez que vi os canais cortando Amsterdam, no Google Maps, não me ocorreu que eles fosse tão funcionais. Quer dizer, claro, eu imaginava que deveriam ter tido um propósito em algum ponto do passado, mas hoje em dia eles estariam lá mais por legado, mais enfeitando a cidade do que tendo serventia real. Chegando aqui fui percebendo que os canais eram uma parte muito útil e muito utilizada da cidade.
Eles são uma via de transporte como outra qualquer, com tudo que é tipo de veículo flutuante passeando por eles, desde minúsculos botinhos com apenas uma pessoa até enormes cargueiros cheio de coisas. Por toda a parte dos canais você vê barcos atracados, lado a lado com carros estacionados, o que dá bem essa noção de que os canais são ruas líqüidas cortando as cidades holandesas.


Há também as famosas casas flutuantes de Amsterdam, que são barcos modificados pra servirem como moradia, permanentemente atracados no mesmo lugar (a não ser para manutenção). Hoje em dia eles são ligados à rede de água, eletricidade, gás (é obrigatório que tenham aquecimento) e, sim, de esgoto - nada de dar descarga no canal. Aliás, nada de fazer xixi, jogar lixo ou outras coisas no canal - é proibido, embora aconteça, claro. O caso mais notório é o das milhares de bicicletas que encontram o seu destino final nos canais de Amsterdam (e de outras cidades holandesas com canais e bicicletas, aliás. Falo de Amsterdam aqui, mas vários destes fenômenos são holandeses e não restritos à capital.) A coisa é tão típica que no Museu Histórico de Amsterdam tem exposta uma bicicleta que ficou décadas no fundo de um canal até ser retirada e colocada lá. Você entra no museu e tem o trecão lá. cheio de cracas. Aliás, muita gente me pergunta porque os holandeses jogam bikes nos canais. Os motivos são diversos, e consigo imaginar alguns. Às vezes a magrela excedeu sua vida útil, e não compensa mais arrumar. Muitos deixam elas abandonadas nas ruas, mas alguns mandam a infeliz nadar. Em outros casos, são bikes roubadas pelos junkies que, ao não encontrarem fregueses, dão um fim na evidência. E em outros casos, são turistas que compram as bikes roubadas dos junkies, passeiam com elas, e antes de viajar, completam a babaquice sujando o canal.

Principalmente no verão, quando o tempo fica melhor, vemos muitos barcos com vários amigos dentro comendo, bebendo e ouvindo música, dividindo os canais com barcos enormes de carga e barcos menores com executivos indo trabalhar.

Outra coisa que me chamou a atenção por aqui é que os canais, na sua maior extensão não têm nenhuma grade de proteção, o que deve causar infartos nos americanos super safety-conscious que porventura venham parar por aqui. Os holandeses estacionam os carros ao lado do canal sem nenhuma barreira física pra avisá-los de algum eventual erro, e garçons andando na beirinha de canais segurando bandejas com pilhas de copos, zanzando entre mesas super apertadas é uma visão comum e não causa nem sequer um levantar de sobrancelhas. Todo mundo fica lá, apreciando a vista, ignorando o garçom pulando as pernas das pessoas a centímetros de um tchibum glorioso. Conta um amigo nosso que um dia viu um cara cair no canal ao sair do bar pra entrar no seu barco pra voltar pra casa. Todos riram, inclusive o cara que caiu, e nada de mais aconteceu.

Agora dois videos sobre canais e barcos no meio da cidade.
Esse vídeo eu fiz meio que no susto. Infelizmente no Youtube não dá pra ver o navio anterior, que era ainda maior.
Já esse eu fiz mostrando uma ponte levadiça aqui de Amsterdam - e elas existem por toda a Holanda. Disse nossa professora de holandês que uma das desculpas mais usadas aqui pra se chegar atrasado é "de brug was open" - a ponte estava levantada. Nesse vídeo dá pra ver porque é fácil de acreditar. Foram três (!) barcos passando em seqüência. Quatro, se contar o micro barquinho que foi no embalo. Ah, sobre a música. O som original do vídeo era basicamente um vento mala soprando o tempo todo, então resolvi colocar no mudo. Porém, ver 4 minutos e 8 segundos sem som nenhum seria chatinho, então escolhi a primeira música que encontrei com exatamente 4:08 min. Oh, e era dos Beatles, que coisa. 🙂
Embora seja complicado comparar cidades, especialmente em países diferentes, eu sempre fico pensando no potencial que os rios Pinheiros e Tietê têm caso não fossem rios mortos, mas vivos e integrados à cidade como, aliás, um dia foram, o que, infelizmente, não cheguei a ver. Talvez justamente pela cidade em que eu morava (e onde cresci) no Brasil não ter essa dimensão extra, eu fico fascinado pelos canais da Holanda, e resolvi mostrar um pouco como é. Espero que tenham curtido.
UPDATE: Ah, e os canais tem mais uma utilidade.