Amsterdam ontem e hoje: Kinkerstraat 1926 e 2010

Deixei a fotografia de lado por muitos anos, apesar de tê-la descoberto quando pequeno — lembro de brincar pequeno em tanques de revelação aposentados da minha mãe e lembro de ter pedido uma câmera de Natal quando eu tinha uns seis anos (ganhei). Mas isso só durou até a adolescência quando entrei numas de não aparecer em fotos e, tristemente, nem tirá-las.

Eu usava o raciocínio de que "as lembranças que importam ficam na memória". Arrogantemente jovem, eu achava que a memória era eterna. Devia parecer assim porque eu tinha poucos anos pra lembrar na cabeça, ainda. Os anos passaram e minha atitude mudou.

Redescoberta e a idéia

Lá por 2003 comecei novamente a fotografar, apenas pra descobrir o tamanho da minha ignorância no assunto (o que é na verdade bom: explorar o conhecido não é explorar.)

Não foi apenas fotografar que redescobri; foram as fotografias também. Aos poucos fui me interessando pelos pioneiros da arte, e acabei fascinado por janelas pra um mundo que desconheço, um mundo passado. Quem diria que fotografia também é viagem?

Viajando no tempo fui percorrendo a ponte pro passado em forma de imagens, e juntei duas paixões recentes procurando fanaticamente fotografias antigas de Amsterdam. Sujei os dedos na feirinha de livros da Spui atrás de, bem, livros, mas também de cartões postais antigos e imagens do passado da cidade.

Em algum dos sebos de Amsterdam (não lembro mais qual), achei um livro chamado "Amsterdam in fotokaarten — huizen en straten in de hoofdstad, 1900-1940", de Wim de Koning Gans. O livro é recente até, de 2000, mas está fora de catálogo, embora você possa achá-lo com alguma facilidade (na BOL tem por €28,00, paguei €12,00 no sebo). E é lindo! O foco não são as pessoas (toda uma outra área igualmente fascinante) mas, como diz o nome, casas e ruas da capital holandesa retratadas em cartões postais.

Folheando e refolheando, entendendo cada vez mais as histórias das fotos conforme meu holandês se aperfeiçoa, surgiu uma idéia.

O Projeto: refotografar Amsterdam

A idéia é ir aos lugares das fotos e refotografar a cidade com os olhos dos fotógrafos (freqüentemente anônimos) do século passado. Ir ao mesmo local e tirar a foto tão igual quanto as condições hoje, meu equipamento e limitações técnicas permitirem.

Porque não? É um jeito de explorar a cidade, de ver coisas que possivelmente passariam batidas, aprender: sobre Amsterdam e sobre fotografia, já que o desafio é maior do que parece, e ele não parece pequeno.

O primeiro passo foi localizar onde foram tiradas as imagens. Nesse ponto, o livro ajuda muito, pois o texto tem bastante informação sobre a localização precisa, e o que viraram algumas das construções. Porém, ainda assim, é preciso descobrir exatamente pra onde estava apontada a câmera, onde ela estava localizada e o quanto da paisagem ela abrangia. Nesse processo de pesquisa preliminar, ajudou muito o Google Street View de Amsterdam.

Resolvi iniciar as buscas na área que conheço melhor, perto de onde eu morava em Amsterdam.

Há lugares em que eu passava na frente diariamente, e até mesmo fotografei sem nem desconfiar que alguém tinha feito o mesmo 110 anos atrás.

Selecionei quatro locais das centenas mostradas no livro e fui-me pra Amsterdam (eu me mudei pra Haia há uns dois meses). Nos locais descobri outros problemas. Um que não é pequeno é que Amsterdam era bem mais calma dezenas de anos atrás. O que eram ruas de terra sem ninguém hoje são avenidas movimentadas, onde você conseguia uma vista livre hoje tem caminhões fazendo entrega o dia todo ou um fluxo constante de pessoas que simplesmente não permite você ficar calmamente obstruindo a passagem.

Parte da graça, claro. É projeto longo, pra ser saboreado. Mas como viajante, eu acredito que a graça está mais no caminho do que no destino, então vou compartilhando com vocês conforme for fazendo. Que acham? Pensei que seria um jeito original de mostrar Amsterdam de uma maneira menos turística.

Tão vamos começar.

O primeiro lugar: Kinkerstraat (Oud-West)

A Kinkerstraat é uma rua de comércio local importante de Amsterdam. Tem loja de departamentos, banco, chaveiro, peixaria, supermercados, loja de eletrônicos, óptica, essas coisas. E muitas lojas "étnicas", especializadas em produtos de outras nacionalidades. Inclusive a loja de produtos brasileiros, a Finalmente Brasil, fica na Kinker.

Enfim, é o tipo de rua importante pra quem mora, mas pouco visitada por turistas, apesar de ficar perto do centro. A minha casa em Amsterdam ficava próxima da Kinker, e muitas das "Fotos do dia" que fiz foram lá (como a foto das bikes no dia-a-dia, por exemplo).

A foto que escolhi pra começar o projeto mostra a vista da Kinkerstraat na esquina com a Tollenstraat.

As fotos: 1926 e 2010

Vamos à foto, que aparece à página 84 do livro "Amsterdam in fotokaarten", tirada de um cartão enviado em 1926:

E agora, a foto que fiz em 2010:

Ambas as fotos podem ser vistas maiores. Basta clicar nelas.

Note que na lateral do prédio era usada em 1926 pra exibir placa publicitária, função que mantém até hoje. A loja chamada "Legerdump" — algo como "depósito/estoque do exército" — é especializada em material pra atividades outdoor (algumas delas não muito nobres). Tem coisas bem interessantes lá com preços bons.

Tá vendo aquela agência do ING? Quando me mudei pra Amsterdam em 2007 era uma agência dos correios, TNT. Com o Postbank sendo adquirido pelo ING, os correios (Postbank era o banco dos correios) virou ING. Em 1926, segundo Win Gans, o espaço era duas lojas que, dois anos depois do envio do cartão, 1928, portanto, foram substituídas pela terceira filial de uma empresa que estava surgindo na capital holandesa: a Hollandsche Eenheidsprijzen Maatschapij Amsterdam, a hoje mega popular HEMA, que a partir dessas 3 primeiras unidades partiu pra dominar a Holanda.

A HEMA é uma loja de departamentos que vende de tudo, e hoje inclusive ela tem uma unidade na própria Kinker, mas mais pra baixo, na esquina com a Jan Peter Heijstraat.

Também é divertido notar que os transeuntes de bicicleta aparecem nas duas fotos, o que ocorre em outras fotos separadas por quase cem anos. Inclusive, procurando os locais no Google Street View, achei uma bicicleta que parecia ser exatamente a mesma da foto antiga, estacionada no mesmo local irregular. Logicamente que não era (eu tive de contar os postes da ponte pra ter certeza), mas juro que meu coração gelou por um segundo.

Existem diversas outras diferenças, inclusive na arquitetura do prédio. Mas vou deixar como exercício pra vocês identificar e explorar os sinais do tempo e o que ficou igual. E claro, compartilhe com a gente nos comentários suas descobertas também.

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